Bruna Morais

Bruna Moraes - monotipia árvore morta 4
Bruna Moraes - monotipia árvore morta 4

Bruna Moraes
Respiro
Vídeo
13:37 minutos

 2021

Bruna Moraes
árvore morta 4
Monotipia: grafite em pó, carvão e terra sobre algodão cru
45 x 50 cm
2021

Bruna Moraes
árvore morta 5
Monotipia: carvão e terra sobre linho
70 x 45 cm
2021

“Respiro”

Esse projeto foi realizado a partir da investigação do espaço de um terreno baldio, localizado junto a minha atual residência na cidade de São Paulo entre os meses de março de 2020 e maio de 2021: período da pandemia. Mais do que um espaço auto-contido, esse lugar interessa por ser uma fresta no concreto urbano. É nesse intervalo que cultivo, além de plantas, encontros, alimentos e modos de contar as suas histórias. Investigo assim, as possibilidades e limitações da própria linguagem. A partir de uma escrita múltipla, construo um texto permeável, tecido entre relatos diarísticos e gravuras do local. Visualmente, renuncio à exatidão técnica da fotografia e do vídeo e opto pelo pinhole, que articulo a uma câmera digital para a criação de um filme que compõe com o texto monográfico e suas imagens.
O jardim, que ao primeiro encontro abrandava os dias de incertezas e por isso já se apresentava potente, começou a revelar-se em suas outras camadas. Habitar esse terreno, compartilhá-lo com os vizinhos, semear e colher fabricam a experiência compartilhada em um momento onde o comum começa a ser cerceado pela instauração da pandemia. Em ações aparentemente pequenas e simples, se inicia um trabalho paciente de recuperação deste espaço de terra até então negligenciado.
O primeiro grande impacto surge do contraste com o entorno. Há possibilidade de pensar a cidade a partir das suas relações e da integração com o solo, tecendo ligações com o território e o meio vivo. O testemunhar das ruínas e seu manuseio ocorre como construção do conjunto de operações técnicas e simbólicas para marcar um espaço de vida e se apropriar dele, dando sentido e identidade. O manejo da terra requer presença e atenção, por vezes capturadas no devir-tempo da vida objetiva. Como a bifurcação entre Crono e Kairós, o deus do tempo linear e o deus do tempo oportuno. O jardim em relação à cidade se constrói como algo a ser evidenciado, conforme percebemos e descrevemos o que já se faz presente nele. Ele é o encontro da oportunidade dentro da linearidade do fazer. É quando a paisagem se institui como potencial crítico do estado real do mundo, num exercício de esperança, responsabilidade e conservação.
A exposição desse trabalho se constrói como requerido academicamente, porém uma escrita monográfica apenas não seria digna o suficiente para apresentá-lo ao mundo. Tento aqui organizar uma síntese, como chave de acesso ao lugar-jardim e tudo o que ele abre, transborda. Texto, filme, gravura e pensamento reivindicam uma condição para além do documental. Junto com as plantas, as gentes e a terra, constitui-se um ecossistema. Realizo aqui três críticas a uma visão triunfalista, que desafiam a imagem transparente a partir da técnica pinhole, de frotagens e monotipias e da própria escrita como criação de imagens mentais. Para falar a língua do jardim, o trabalho une tais práticas na intenção de florestificar seus elementos e compartilhar a experiência da descoberta. Tanto a de si dentro do processo, quanto a do mundo como algo não-inerte que, ecoando Bruno Latour (2020), pede pelo convencimento de estabelecer conosco uma espécie de acordo ou ritual. O sagrado em meio às coisas ínfimas. Sigo escutando.

 Orientação TFG: Jorgge Menna Barreto