SEMA
Escritas Fracassadas
Vídeo digital
1:6 minuto
2021
Escritas Fracassadas
O trabalho consiste em uma performance na qual utilizo um batom vermelho para escrever a palavra “solidão” em meu próprio rosto. Considero o gesto de escrever como falho e fracassado, a começar pelos materiais de escrita inusitados: o batom velho e gasto, que forma letras tão grossas que quase não aparecem juntas em um mesmo ângulo; e a pele de meu próprio rosto, que, usada como superfície de inscrição, vai sendo levemente distorcida pela pressão do objeto.
A escolha do batom como um dos elementos centrais do trabalho remete diretamente a um episódio de minha adolescência em que postei uma foto de mim mesmo usando batom em uma rede social. Esse acontecimento gerou uma série de violências verbais direcionadas a mim, pelo simples fato de o uso do batom ter sido considerado um rompimento do padrão masculino, cisgênero e heterossexual. O batom seria, portanto, um código que delimita fortemente a separação binária entre feminino e masculino, ao ser aceito apenas em quem é lido socialmente como “mulher”.
A solidão está presente nas vivências de pessoas LGBT+ desde o momento em que a condição de “diferente” nos é atribuída, mesmo quando ainda somos inocentes demais para compreender os motivos. Ela nos assombra quando precisamos reprimir quem somos para preservar nossa posição em contextos sociais específicos, pois sabemos que temos muito a perder; e também quando nos sentimos constantemente deslocados e sem alguém que compreenda nossas dores. Em minha experiência pessoal, recordo que, durante boa parte de minha adolescência, ser bicha era o meu maior problema. Ao chegar à vida adulta, essa posição foi substituída pela solidão de ser bicha; um aspecto que acredito ter afetado uma série de decisões acerca de onde eu deveria ir a partir de então. Penso que não é por acaso que aparentemente um número considerável de pessoas LGBT+ escolham cursar uma graduação em artes ou áreas afins, muito por conta de uma suposta liberdade que é esperada dentro de uma formação como essa (que ainda assim não a torna isenta de LGBTfobia), ou por diversos outros motivos sociais ou pessoais que as impediriam de estar seguindo alguma outra carreira considerada mais convencional. A graduação em artes foi para mim talvez não uma cura ou uma solução definitiva, mas uma forma de lidar com estas frustrações, principalmente pela possibilidade de trazer tais questões em minha prática artística e agora neste trabalho de conclusão.
Orientação TFG: Analu Cunha